Diz a lenda familiar, que sou petista “desde criancinha”. Lá nos idos dos meus 3 anos dizem que eu ficava extasiada pela figura da então candidata Esmarlei. Eu não compreendia nada, mas talvez o fato de ter uma mulher em meio a tantos homens carregando uma estrela de cor vibrante no peito já chamava a atenção daquela pequena criança. Os anos se passaram e inevitavelmente fui me simpatizando cada vez mais com tudo o que se referia ao PT. De fato, eu só pude compreender mesmo o que era o partido quando já estava na adolescência. A simpatia que a princípio era motivada pelo simbolismo foi ganhando corpo quando vi que pessoas que sempre foram referência em minha formação, agora estavam defendendo “algo” relacionado àquela legenda.
Sem dúvida alguma, o ano de 2002 foi o marco da minha consciência partidária. E ver o entusiasmo de tantos experientes políticos pela vitória do Lula, além de me emocionar despertou o interesse mais efetivo sobre o que realmente significava o Partido dos Trabalhadores e só então, pude começar a trilhar o que se chama de militância.
Há sete anos, então, já eleito o personagem fundamental do partido, eu acordava todos os dias com um propósito motivador: ver uma administração petista no nosso município, afinal eu já compreendia que “ser PT” era mais que carregar uma estrela no peito. “Ser PT” é, acima de tudo, defender um projeto de democracia para o país. Projeto este que anuncia formas peculiares de participação, desenvolvimento e inclusão social.
Durante quatro anos, após ter tido o privilégio de ver tal conquista local, não me arrependi em nem um minuto de toda sola de sapato gasta na campanha das eleições municipais.
Neste meio tempo, muitas agitações aconteceram no governo federal de modo a estremecer de certa forma alguns alicerces “sólidos” do PT. Escândalos oriundos do pragmatismo adotado pelo partido tomaram a cena a partir de 2005. Por outro lado, muito do que “aquele” projeto propunha foi visto se estabelecer: o país cresceu, superou problemas históricos, jovens passam a ver a educação como uma possibilidade real, foi feita uma massiva distribuição de renda, etc.Temos então uma conta de soma zero? De forma alguma.
Sou do tipo que defende que uma administração petista, devido ao legado histórico a que o partido se propôs, não deve dar margem à equidade do jogo corruptor, a valores conservadores e acordos que tenham como fim o privilégio de poucos. Fosse assim, qual o porquê de se formar um “partido dos trabalhadores”?
Em se tratando de esferas locais a responsabilidade se torna ainda maior, já que é nas cidades que as relações individuais se fundam e que a política influencia direta e instantaneamente a vida dos cidadãos.
Neste sentido, devo confessar: sinceramente estou chocada com o que tenho visto acontecer do cenário político da minha querida Jales nos últimos tempos. E passados os sete anos, já estou pensando em cobrar as solas do meu calçado.
Aliás, é isto que estou fazendo ao escrever este texto. Afinal, devo confessar outra coisa, sou “conservadora” no seguinte aspecto: não quero me adequar às novas formas de cobranças que meus “companheiros” passaram a adotar. Continuo compartilhando dos velhos e bons valores petistas de fazer política pela discussão, pela argumentação e acreditando que as conquistas se dão na arena política pública, e não pelas formas de benefícios individuais e/ou parentais.
Posso cobrar. E que não venham fazer nenhum “B.O.” contra minha manifestação. Acho que não farão, afinal não sou um quadro importante a se calar, pois não sou um “arquivo vivo”. E aqui chegamos a mais um ponto de minha contestação: é inadmissível que administradores petistas tenham contra si este tipo de “arquivo”, partindo de uma lógica básica: petistas não surgiram para fazer ações que possam voltar contra si. Se fosse legítimo se falar em moral no âmbito da política, poderia afirmar que é “imoral” o petista que acumula acusações contra sua forma de atuar.
Além de militante, sou estudante da política e do PT. Pois bem, estou aqui lendo um livro intitulado: “O Modo Petista de Ação Parlamentar: uma contribuição para Vereadores e Vereadoras”. O texto foi publicado em comemoração aos 25 anos do PT pela editora da Fundação oficial do partido.
No item denominado “O modo petista de atuação parlamentar” constam os seguintes dizeres: “Nossos parlamentares têm atuado em defesa de políticas públicas que garantam a cidadania para todos, têm fiscalizado com responsabilidade o Poder Executivo e denunciado atos contrários aos interesses do povo, procurado se fazer representantes dos setores oprimidos e dos trabalhadores em geral”. Elenca ainda “pontos que podem orientar o parlamentar petista a manter uma atuação coerente com a trajetória do partido”, dentre outros, são eles:
1. ÉTICA NA POLÍTICA – atuar contra a corrupção e em favor do rompimento com práticas ainda enraizadas, como o fisiologismo, o corporativismo e o nepotismo;
2. TRANSPARÊNCIA ADMINISTRATIVA E CONTROLE SOCIAL – o controle social da gestão pública é fundamental para a democracia. O vereador deve empenhar-se no exercício da função fiscalizadora e buscar construir mecanismos de acompanhamento do Executivo.
Agora façamos um rápido estudo de caso. Na pacata Jales temos no Poder Executivo um representante petista e no Poder Legislativo três membros do partido. Um deles é peso morto, não se ouve a voz nem para o uso da tribuna; outro usa vendas para as lástimas que vemos se apresentar a cada dia; e, por fim, outro está sofrendo processo interno do partido por “depor contra a administração”. Oras, de acordo com o que foi apresentado acima, quem aí está atuando efetivamente segundo o “manual interno” do Partido dos Trabalhadores?
De acordo com os regimentos internos do PT, o mandado de qualquer representante “é do partido”. Porém, a administração é pú-bli-ca. E cabe, portanto aos vereadores fiscalizarem as formas pelas quais tal administração cumpre sua função. Não está exposto nas diretrizes acima que esta forma de atuação deve valer apenas em situações em que os vereadores fazem “oposição” ao Executivo. Até por que, os vereadores são “trabalhadores do povo” e ao “povo” não se deve fazer oposição, sobretudo, em se tratando de legisladores petistas.
Por fim, somente mais um rápido raciocínio. No ultimo mês temos acompanhado a novela do “cai-não-cai”. Decisões judiciais, recursos interpostos, deposição do cargo, mais recursos, gastos com defesa, viagens, e por fim “o retorno do rei”. E tudo isso por quê? Pelo medo de deixar o tão suado poder.
É triste ver também que os petistas, talvez por ter demorado tanto a conquistar os altos postos, perderam a noção do sentido que faz o “poder” para nós. Lá nos primórdios, lá naquelas teses lançadas do Colégio Sion em 10 de fevereiro de 1980 (será que todos sabem o que isso significa?), “poder” era algo que estava no horizonte de todos, sim.
Porém, o “poder” era uma forma de viabilizar a implantação do projeto político e democrático de sociedade que se pensou para o Brasil. Para o petista, estar no “poder” deve significar um estado, um meio, e não um fim. Não se deve fazer das câmaras municipais, das prefeituras, do congresso ou de qualquer esfera institucional o “quintal da própria casa”. Isso nossos adversários já fazem desde sempre. Mais uma vez, se fosse assim, qual o porquê de se formar um “partido dos trabalhadores”?
Lembremo-nos, caros amigos, que foi justamente para romper com esta lógica que tantos companheiros se reuniram no início daquele ano e deu origem ao maior e mais atuante partido de esquerda deste país. Tudo isso não é um mero jogo de palavras, mas um código de conduta política.
Eu não deixarei o partido. E acho que muitos não devem deixar. Devemos lutar de dentro, pois é justamente o nosso lugar de fala que legitima nossa crítica. É o passado, são muitos pontos no presente e é, sobretudo, nosso histórico que nos dão respaldo.
Tenho dito.
Saudações petistas, hoje e sempre!